Château Kirwan é um dos mais renomados Châteaux de Bordeaux, um Troisième Cru Classé.

Yann Schÿler, Diretor Geral do Château Kirwan, concedeu uma entrevista exclusiva para a DiVinho, falando da tradição dos vinhos de Bordeaux, da classificação de 1855 e de seus dois vinhos, Château Kirwan e Les Charmes de Kirwan, confira:

Yann Schÿler
Yann Schÿler

Kirwan é um dos mais tradicionais Châteaux de Bordeaux, conte um pouco dessa história.

A história do Château Kirwan é bastante especial.

Primeiramente, Kirwan é um nome puramente irlandês e que faz parte da tradição irlandesa em Bordeaux.

Várias famílias irlandesas estabeleceram-se em Bordeaux durante o século XVIII.

A Irlanda era um país bastante católico e quando a Inglaterra tornou-se protestante as famílias nobres irlandesas escaparam do país, pois estavam sendo perseguidas.

Elas encontraram um refúgio na França com Luís XIV.

Eram pessoas extremamente qualificadas, militares de alto ranking, engenheiros e importantes comerciantes, que encontram refúgio e mantiveram-se na França.

Algumas dessas famílias tornarem-se bastante conhecidas nos negócios do vinho e das bebidas. 

Como a família Hennessy do Conhaque Hennessy, a família Barton do Château Léoville Barton, a família Lynch do Château Lynch-Bages, a família Boyd do Château Boyd-Cantenac, a família Brown do Château Brown e finalmente a família Kirwan.

A família Kirwan, assim como a família Lynch e a família Brown, vêm de Galway, no oeste da Irlanda.

Essas famílias faziam parte das Tribos de Galway, que pelos últimos quinhentos anos estiveram no poder na região. 

Os Kirwan vieram para a França no início do século XVIII.

Mark Kirwan casou-se com a filha de Sir John Collingwood, proprietário do Domaine la Salle.

Como os irlandeses gostavam de colocar seu nome nas propriedades foi mudado o nome para Château Kirwan, que se mantém até hoje. 

Minha família envolveu-se com o Château Kirwan em 1925, quando meu bisavô adquiriu a propriedade.

Quando compramos o Château já éramos negociantes de vinhos por quase duzentos anos, desde 1739.

E essa é realmente uma longa história. 

Château Kirwan
Château Kirwan

Château Kirwan foi classificado como Troisième Cru Classé e como o 16º melhor vinho de Bordeaux em 1855. Qual foi o impacto dessa classificação?

A classificação é muito importante, mas não é uma competição, é um monumento histórico.

É preciso lembrar que foi uma iniciativa do último imperador, Napoleão III, para destacar os melhores vinhos do Médoc, da margem esquerda, em uma classificação por grupos para apresentá-los na Exposição Mundial de 1855 em Paris. 

A Apelação não existia nessa época, mas foram analisados o terroir e a localização dos vinhedos.

E isso foi relacionado ao preços dos vinhos.

Criou-se  uma hierarquia de Premiers, Deuxièmes, Troisièmes, Quatrièmes e Cinquièmes Cru Classé.

Château Kirwan foi classificado como primeiro entre a categoria Troisième, por conta da localização e do preços dos vinhos na época. 

Ser um Château Cru Classé significa que você faz parte da história, mas também significa que temos que trabalhar da melhor maneira possível todos os anos.

Significa também que nosso terroir é único, comparado com outros Châteaux que não fazem parte da classificação de 1855.

Vinhedos Château Kirwan
Vinhedos Château Kirwan

Outro ponto importante na história do Château foi a compra da propriedade pela família Schÿler em 1925, mas Schröder & Schÿler já distribuíam os vinhos há mais tempo. 

Esse é realmente um ponto importante da história de Bordeaux.

Pois antigamente eram os mercadores que cuidavam do mercado.

Minha família distribuía os vinhos em todo mundo e em muitos casos tínhamos exclusividade.

No início do século XX tínhamos duas exclusividades, um branco, Château Carbonnieux, e um tinto, Château Kirwan.

Começando em 1904 negociávamos Château Kirwan com exclusividade, comprando todo ano do proprietário. 

Então veio a Primeira Guerra e a maior parte dos Châteaux estava à venda. O dono do Château Kirwan queria vendê-lo.

Meu bisavô, Armand Schÿler, viu uma grande oportunidade de investimento e decidiu adquiri-lo em 1925.

Sala das Barricas Château Kirwan
Sala das Barricas Château Kirwan

Os vinhedos estão localizados no Plateau de Cantenac, em Margaux. Fale um pouco desse terroir.

Na Apelação Margaux tem-se o terroir central, que é chamado Plateau de Cantenac.

É dividido entre alguns Châteaux, como Brane-Cantenac, Kirwan, Palmer, Margaux, Marquis de Terme e Lascombes. 

Tem-se então outro terroir, que é conhecido como o “croissant”, que começa no sul com  Château D’Arsac, vai para oeste com Château Giscours, passa por Château D’Arsac e Château Du Tertre e termina ao norte. 

Esses dois terroirs são levementes diferentes.

Nós estamos localizados bem ao centro, logo no começo do Plateau de Cantenac, indo do sul para o norte. 

Mas mais importante é quando se vai do leste ao oeste.

No lado leste está o Rio Gironde, que costumava ser um rio maior e quando a água recuou deixou para trás cinco faixas sucessivas de cascalho e areia, que fazem os terroirs únicos do Médoc.

Essa configuração não é encontrada em nenhum outro lugar do mundo.

É o motivo que fazemos esses vinhos nessa região particular.

Se você for vinte quilômetros adiante é outra história.  

Nesse terroir particular você tem as cinco faixas do leste para o oeste.

Começando na faixa um e seguindo dois, três, quatro e cinco.

O melhor de Margaux está em dois, três e quatro.

E o Plateau de Cantenac está em dois, três e um pouco de quatro. 

São colinas muito pequenas, de apenas quarenta metros, mas onde é possível notar pequenas elevações.

São colinas de cascalho, areia e calcário, onde Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc crescem muito bem.

Em alguns pontos, abaixo do solo existem camadas de argila, onde é plantado Merlot. 

Dessa maneira, o Plateau de Cantenac é muito interessante, o mesmo fenômeno acontece em Saint-Julien e Pauillac.

Cada uma dessas Apelações conta com terroirs únicos. 

A nova adega é um projeto de Kinga e Anatoly Stolnikoff, qual foi a inspiração do projeto?

Para os portões do Château Kirwan foram desenhadas videiras, esculpidas em aço e incluídas palavras relacionados ao mundo do vinho.

Se você olhar para os portões de longe parece uma videira com galhos bastante altos, de quatro metros de altura.

Mas se olhar de perto, nota as palavras Margaux, Charme, Elegância, Finesse, 1855, Château e Vinhedos.

É uma maneira de dizer que as videiras estão inspirando o ser humano. 

Adega Château Kirwan
Adega Château Kirwan

Château Kirwan é um dos mais renomados vinhos de Bordeaux, qual o seu segredo?

Eu não vou falar de vinificação, pois o segredo dos grandes vinhos de Bordeaux não é sobre as técnicas de produção.

A produção dos vinhos consiste em conhecer o terroir, saber o que acontece no solo e entender exatamente quando as uvas estarão maduras.

Nós temos  trinta e cinco parcelas no Château Kirwan que vinificamos em trinta e cinco diferentes tanques.

Temos Merlot, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon e Petit Verdot. 

Quando selecionamos a variedade certa para cada parcela, queremos entender como essas parcelas amadurecem e a cada ano isso pode ser um pouco diferente.

Deixamos o vinho falar por ele mesmo e o terroir expressar-se através das uvas.

Pois temos o melhor terroir possível em Margaux. 

Nosso trabalho é entender o terroir e saber como as uvas vão reagir.

Quando as uvas estão perfeitamente maduras a vinificação é muito simples.

Não há nada a fazer além de garantir que a temperatura não suba ou desça muito, o processo deve ser suave e natural.

Sem extração, sem manipulação.

Nosso diretor e enólogo, Philippe Delfaut, costuma dizer que é um “ajudante das uvas”.

O terroir vem em primeiro lugar e não o enólogo, o que é muito diferente de outras partes do mundo. 

O que é importante para nós é que as uvas cheguem à garrafa sem perturbações.

E como fazer isso? Pela gravidade, evitando bombas.

Para possibilitar esse processo fizemos a renovação da adega.

Toda a tecnologia é voltada para a simplicidade, para garantir a pureza da fruta desde o início até o final. 

Philippe Delfaut
Philippe Delfaut

Les Charmes de Kirwan é o “irmão mais novo” do Château Kirwan. Fale um pouco desse rótulo. 

Les Charmes de Kirwan é um vinho que criamos em 1993 como um pequeno Château Kirwan.

É feito exatamente como o Château Kirwan, a única diferença é a seleção de uvas. 

Como mencionei, nós temos trinta e cinco parcelas que são vinificadas separadamente.

Dessas trinta e cinco parcelas fazemos dois vinhos, o irmão mais velho Château Kirwan e o irmão mais novo, Les Charmes de Kirwan. 

Testamos cada um dos trinta e cinco tanques para decidir quais irão para Château Kirwan.

Quando dizemos não à algum tanque para o Château Kirwan, é porque não tem intensidade necessária ou  a colheita foi feita muito cedo ou muito tarde, entre outros fatores. 

Não é possível alcançar a perfeição 100% das vezes.

Todos os grandes Châteaux têm um segundo vinho, até mesmo um terceiro vinho. 

Todas uvas que vão para o Les Charmes de Kirwan são de extrema qualidade e nos garantem um vinho de qualidade a cada ano.

Mesmo que o vintage tenha sido difícil, o vinho fica o mais perto da perfeição possível. 

Colheita Château Kirwan
Colheita Château Kirwan

Existe uma nova geração de jovens que estão descobrindo os prazeres dos vinhos, como é atender esse público?

O problema com a nova geração é que eles estão acostumados com os vinhos do Novo Mundo, que tem muita doçura.

Para um vinho fino essa doçura é um erro.

Se existe doçura ele não pode ser um vinho francês, não falando dos vinhos de sobremesa claro, que é um nicho diferente.

Na França os vinho são secos, temos o álcool, os taninos e a acidez, e essa é sua base.

Alguns países tentam apelar para o público mais jovem produzindo vinhos doces e como não temos isso, eles acham nossos vinhos austeros.

Nossos vinhos não tem a doçura, mas eles têm a complexidade e a finesse da fruta.

Nós podemos proporcionar uma nova descoberta para esses consumidores, não com a doçura, mas com o caráter frutado.

A partir disso eles podem descobrir vinhos mais estruturados, mais tânicos e mais poderosos gradualmente.


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